terça-feira, 29 de maio de 2007
O Convite
Sugiro que se leia o que o Prof. Milton Santos (posts supra) nos alertou e declarou. Não se deve restringir-se a ele, é bom que se diga. Porém, embora seja apenas uma sugestão, creio que seus escritos podem servir como um bom ponto de partida (ou de chegada) e reflexão, ficando a cargo da vontade e talento de cada um deter-se segundo suas preferências em um aspecto qualquer porventura levantado pelo mesmo.
Certamente não serão requeridos erudição parnasiana ou a genialidade de um Drummond ou Machado, bastando que haja clareza e uma conclusão. Um limite de palavras ao meu ver razoável seria de 200 a 300, mas isso é discutível também. Não obstante, é do bom senso evitarmos textos excessivamente rebuscados ou aqueles em forma do que poderia chamar ironicamente de 'decretos' (aqueles em que aventura hermenêutica exige a leitura de quase uma biblioteca). Além do que, costumam desconsiderar os limites da paciência humana.
(...)
Pretendo formar uma comissão de número ímpar no intuito de auxiliar o julgamento dos escritos, uma vez que dificultaria um julgamento enviesado e míope, além de desembocar sempre num resultado, através do chamado voto de Minerva.
Podem mandar para gschirmer21@gmail.com se preferirem.
Há, no entanto, regras a serem seguidas! Leia-as no primeiro comentário deste post, logo abaixo.
Bjos e boa escrita!
segunda-feira, 28 de maio de 2007
Mais de Milton Santos
O mundo do pragmatismo 'triunfante' pode destruir o equilíbrio educacional entre a formação para uma vida plena e a formação para o trabalho
Os deficientes cívicos
MILTON SANTOS
Em cada sociedade, a educação deve ser concebida para atender, ao mesmo tempo, ao interesse social e ao interesse dos indivíduos. É da combinação desses interesses que emergem os seus princípios fundamentais e são estes que devem nortear a elaboração dos conteúdos do ensino, as práticas pedagógicas e a relação da escola com a comunidade e com o mundo.
O interesse social se inspira no papel que a educação deve jogar na manutenção da identidade nacional, na idéia de sucessão das gerações e de continuidade da nação, na vontade de progresso e na preservação da cultura. O interesse individual se revela pela parte que é devida à educação na construção da pessoa, em sua inserção afetiva e intelectual, na sua promoção pelo trabalho, levando o indivíduo a uma realização plena e a um enriquecimento permanente. Juntos, o interesse social e o interesse individual da educação devem também constituir a garantia de que a dinâmica social não será excludente.
Em todos os casos a sociedade será sempre tomada como um referente, e, como ela é sempre um processo e está sempre mudando, o contexto histórico acaba por ser determinante dos conteúdos da educação e da ênfase a atribuir aos seus diversos aspectos, mesmo se os princípios fundamentais permanecem intocados ao longo do tempo. Foi dessa forma que se deu a evolução da idéia e da prática da educação durante os últimos séculos, paralelamente à busca de formas de convivência civilizada, alicerçadas em uma solidariedade social cada vez mais sofisticada.
As modalidades sucessivas da democracia como regime político, social e econômico levaram, no após guerra, à social-democracia. A história da civilização se confundiria com a busca, sempre renovada, e o encontro das formas práticas de atingir aqueles mencionados princípios fundamentais da educação, sempre a partir de uma visão filosófica e abrangente do mundo.
Esse esforço, para o qual contribuíram filósofos, pedagogos e homens de Estado, acaba por erigir como pilares centrais do sistema educacional: o ensino universal (isto é, concebido para atingir a todas as pessoas), igualitário (como garantia de que a educação contribua a eliminar desigualdades), progressista (desencorajando preconceitos e assegurando uma visão de futuro).
Daí, os postulados indispensáveis de um ensino público, gratuito e leigo (esta última palavra sendo usada como sinônimo de ausência de visões particularistas e segmentadas do mundo) e, dessa forma, uma escola apta a formar concomitantemente cidadãos integrais e indivíduos fortes. Aliás, foram essas as bases da educação republicana, na França e em outros países europeus, baseada na noção de solidariedade social exercida coletivamente como um anteparo, social e juridicamente estabelecido, às tentações da barbárie.
A globalização, como agora se manifesta em todas as partes do planeta, funda-se em novos sistemas de referência, em que noções clássicas, como a democracia, a república, a cidadania, a individualidade forte, constituem matéria predileta do marketing político, mas, graças a um jogo de espelhos, apenas comparecem como retórica, enquanto são outros os valores da nova ética, fundada num discurso enganoso, mas avassalador.
Em tais circunstâncias, a idéia de emulação é compulsoriamente substituída pela prática da competitividade, o individualismo como regra de ação erige o egoísmo como comportamento quase obrigatório, e a lei do interesse sem contrapartida moral supõe como corolário a fratura social e o esquecimento da solidariedade.
O mundo do pragmatismo triunfante é o mesmo mundo do "salve-se quem puder", do "vale-tudo", justificados pela busca apressada de resultados cada vez mais autocentrados, por meio de caminhos sempre mais estreitos, levando ao amesquinhamento dos objetivos, por meio da pobreza das metas e da ausência de finalidades. O projeto educacional atualmente em marcha é tributário dessas lógicas perversas. Para isso, sem dúvida, contribuem: a combinação atual entre a violência do dinheiro e a violência da informação, associadas na produção de uma visão embaralhada do mundo; a perplexidade diante do presente e do futuro; um impulso para ações imediatas que dispensam a reflexão, essa cegueira radical que reforça as tendências à aceitação de uma existência instrumentalizada.
É nesse campo de forças e a partir dessa caldo de cultura que se originam as novas propostas para a educação, as quais poderíamos resumir dizendo que resultam da ruptura do equilíbrio, antes existente, entre uma formação para a vida plena, com a busca do saber filosófico, e uma formação para o trabalho, com a busca do saber prático.
Esse equilíbrio, agora rompido, constituía a garantia da renovação das possibilidades de existência de indivíduos fortes e de cidadãos íntegros, ao mesmo tempo em que se preparavam as pessoas para o mercado. Hoje, sob o pretexto de que é preciso formar os estudantes para obter um lugar num mercado de trabalho afunilado, o saber prático tende a ocupar todo o espaço da escola, enquanto o saber filosófico é considerado como residual ou mesmo desnecessário, uma prática que, a médio prazo, ameaça a democracia, a República, a cidadania e a individualidade. Corremos o risco de ver o ensino reduzido a um simples processo de treinamento, a uma instrumentalização das pessoas, a um aprendizado que se exaure precocemente ao sabor das mudanças rápidas e brutais das formas técnicas e organizacionais do trabalho exigidas por uma implacável competitividade.
Daí, a difusão acelerada de propostas que levam a uma profissionalização precoce, à fragmentação da formação e à educação oferecida segundo diferentes níveis de qualidade, situação em que a privatização do processo educativo pode constituir um modelo ideal para assegurar a anulação das conquistas sociais dos últimos séculos. A escola deixará de ser o lugar de formação de verdadeiros cidadãos e tornar-se-á um celeiro de deficientes cívicos.
É a própria realidade da globalização -tal como praticada atualmente- que está no centro desse debate, porque com ela se impuseram idéias sobre o que deve ser o destino dos povos, mediante definições ideológicas sobre o crescimento da economia, como a chamada competitividade entre os países. As propostas vigentes para a educação são uma consequência, justificando a decisão de adaptá-la para que se torne ainda mais instrumental à aceleração do processo globalitário. O debate deve ser retomado pela raiz, levando a educação a reassumir aqueles princípios fundamentais com que a civilização assegurou a sua evolução nos últimos séculos -os ideais de universalidade, igualdade e progresso-, de modo que ela possa contribuir para a construção de uma globalização mais humana, em vez de aceitarmos que a globalização perversa, tal como agora se verifica, comprometa o processo de formação das novas gerações.
sábado, 26 de maio de 2007
Entrevista à Carta Maior
Carta Maior – Como a senhora vê uma provável desocupação da reitoria da universidade mediante uso da força policial?
Olgária Matos – Seria gravíssimo se isso viesse a acontecer. Parece-me que o significado das reivindicações dos estudantes é legítimo, o que deve ser discutido com a Reitora e não com a Polícia Militar.
Acredito que esta ocupação foi uma fórmula para estes jovens darem uma aula de democracia ao poder instituído na universidade. Eles devem ter consciência total ou parcial do que está acontecendo, e assim se faz o difícil aprendizado democrático que as autoridades universitárias não conseguem entender.
CM - A senhora, que tem uma longa história na universidade, já presenciou este tipo de ação da Polícia Militar dentro do campus?
Olgária - Eu só me lembro da ocupação do prédio da Maria Antônia [batalha ocorrida em outubro de 1968 entre estudantes de Filosofia da USP e da Universidade Mackenzie]. Foi o dia mais triste da história desta instituição e de todas as universidades do Brasil, se você quer saber.
CM – Qual o significado simbólico da presença da Polícia Militar no campus? Trata-se apenas de autoritarismo?
Olgária - Não é autoritarismo, é pior. Porque quando há autoritarismo, ele previne muitas vezes o uso da força policial, porque já faz [implicitamente] o papel de polícia. Não é que os policiais sejam maus. Mas o que significa a presença da polícia armada dentro de um campus, sendo que as nossas únicas armas são os livros e o pensamento?
É muito grave, porque se ocorrer isso, serão armas desiguais, e o recinto universitário é um lugar que fica distante do conflito armado urbano. Enviar a Polícia Militar neste caso é como tentar intimidar um movimento civil, intelectual e político dos estudantes. Seria responder a isso com a força bruta, então é totalmente absurdo.
CM – A senhora diz que as reivindicações são legítimas. O que pensa da ocupação na Reitoria?
Olgária - Eu acho que os estudantes que lá estão têm consciência de que eles não representam todos os estudantes, todos os professores e todos os funcionários da universidade. Se eles discutiram e na dinâmica do movimento estudantil foi decidido assim, não cabe a nós julgar.
Não sei, mas talvez eles se sintam desatendidos e não encontraram quem intermediasse as suas reivindicações. Acho que [ocupar] foi uma atitude extrema, mas toda esta politização amadurece e ensina. Todas as reuniões, estas discussões, tudo isso esclarece a consciência dos atos dos alunos. Isso amadurece a vida política da universidade e dos estudantes. Antes de avaliar se é legítimo ou não, acho que vale olharmos a politização que o ato teve e em como isso vai ficar na história da universidade.
CM - Existe um consenso dentre os professores de que utilizar a força policial para fazer a desocupação da Reitoria é desnecessário?
Olgária - Os professores não querem violência na desocupação. O que não é consenso é sobre a ocupação ou não da Reitoria. Há professores que crêem que ocupar este prédio é um excesso de ativismo. Simbolicamente é um lugar muito importante, é o lugar da autoridade, a Reitoria, que é necessária para coesão de toda a vida universitária.
É claro que há muitos professores que não pensam que [a ocupação] é uma atitude que deve ser promovida ao status de arma política ou forma de luta política. Agora, parece que as últimas gestões da Reitoria e das direções dos cursos vêem os estudantes como uma parte desprezível ou secundária na vida universitária. Na verdade, a razão de ser da USP é a docência e a pesquisa, que não são duas coisas separadas.
A docência existe, então é essencial existirem aulas. Eu acho que os estudantes são a matéria nobre da instituição, e vejo uma desconsideração [da Reitoria].
Se a reitora Suely Vilela marca uma audiência pública e não pode aparecer [primeira razão do protesto dos estudantes], ela deveria enviar alguém, um representante. Os estudantes não estão [fazendo a ocupação] em uma causa vazia. Eles querem defender a universidade. Em vários países do mundo, a universidade está a salvo das ingerências policiais, porque ela é a única capaz de garantir pensamento livre. As novas idéias não podem ser cerceadas.
Então você tem que responder intelectualmente ao movimento estudantil, que está fazendo uma defesa da autonomia universitária. Não é só autonomia orçamentária, mas é de pesquisa e de deliberações. É uma questão de filosofia política séria. E mais: é uma questão de dignidade institucional. Não dá para inverter uma lei que foi conquistada com muita luta dos docentes, depois de um longo período de ditadura. Ou seja, estes decretos causam uma reação instantânea de quem entende o que é a universidade.
A sociedade brasileira entende mal o papel de uma universidade, infelizmente. Nosso país tem elites avarentas no seu conhecimento, que não querem compartilhá-lo com a sociedade. A universidade é mal-entendida, por isso há espaço para a reitora Suely não se dispor a negociar mais. Até agora, os professores tentaram fazer algumas comissões para negociar com ela. Mas Suely não recebe nem estes grupos, formados às vezes por professores universitários e intelectuais renomados.
CM – A senhora acredita que os decretos de fato ferem a autonomia universitária?
Olgária – Claro que ferem! Só a idéia de ter um decreto já fere a autonomia. Não dá para dizer o contrário quando existe uma rotina consolidada na universidade mais importante da América do Sul, e que acaba alterada desta forma.
A universidade sabe o que faz, o que precisa e o que conduz. Ela presta periodicamente contas ao governo, e sabe a dinâmica de seus cursos, de suas publicações, de suas relações com docência, pesquisa, extensão, os congressos, as relações com outras universidades, com o ensino superior estrangeiro. O governo que está fora dela vai deliberar se o que a universidade faz está correto ou não, se tem qualidade ou não?
O governo é uma instância burocrática político-administrativa externa à universidade, que tem que dialogar. Mas não é na forma de decreto que se cria esse diálogo. Fazer os decretos é uma expropriação das práticas e consciência universitária, isso é gravíssimo.
Estamos vivendo o fim da universidade pública, gratuita e de qualidade. Não é um ataque isolado. Trata-se de um processo maior do que o governo de José Serra (PSDB-SP), que é só um emissário desta situação [de mercantilização] das universidades.
* Olgária Matos é professora de Filosofia Política do Departamento de Filosofia da FFLCH-USP e autora, entre outros, de Os Arcanos do Inteiramente Outro A Escola de Frankfurt, a Melancolia, a Revolução (Brasiliense).
terça-feira, 22 de maio de 2007
Milton Santos - um 'profeta' do que é a chamada "Globalização"
O acesso à informação é um dos maiores entraves à efetivação da democracia em nosso mundo. Particularmente se pensamos em termos nacionais - vide nossos infinitos brasis -, e mesmo em nível mundial.
Uma pálida amostra disso recentemente aconteceu há pouco quando por volta do dia 25/05 o Blog da USP (de onde tenho tirado boa parte das entrevistas e matérias dos meus últimos posts), outrora situado no site Terra, teve de ser alocado em outro servidor. Não julgo provável que tal fato tenha ocorrido ao acaso simplesmente, embora tenda a rejeitar 'teorias conspiratórias'. De qualquer modo, sabemos que quanto maior o número de opiniões sobre um fato - no caso, sobre a ocupação - maior será nossa liberdade para julgar e avaliar com maior sensatez a legitimidade do possível ressurgimento do movimento estudantil e dos fatores estruturais que motivaram esta ocupação.
Considerando, portanto, o acesso permanente à informação como condição inalienável de garantia soberania dos povos e à sua cidadania, decidi por bem disponibilizar uma análise do Prof. Milton Santos, mestre a quem devemos muito e que muita falta faz nesses dias em que a vocação totalitária tem feito escola e discípulos fervorosos - convictos do individualismo liberal e obscurantismo político mundial - sem que até o momento tenha sido combatido por uma oposição engajada nos valores da coletividade, seja de modo ideológico ou não. O mais importante nesse delicado momento pelo qual passamos é deixar algumas divergências menores de lado e nos unirmos em prol de um interesse maior: o do coletivo. Ninguém é vanguarda de ninguém! "Somos todos iguais, braços dados ou não", porém de braços cruzados e desunidos não cessaremos de colecionar derrotas em nome do individualismo. Enquanto dormimos o inimigo está bem acordado......
Por Milton Santos
“Opor à crença de que se é pequeno, diante da enormidade do processo globalitário, a certeza de que podemos produzir as idéias que permitem mudar o mundo”.
"Evocamos aqui, um de nossos maiores pensadores, Milton Santos, geógrafo, professor emérito da Universidade de São Paulo e autor de mais de 40 livros, publicados em diversos países. Em 1994, recebeu o Prêmio Internacional de Geografia Vautrin Lud. Lecionou também em importantes universidades no exterior. Nasceu na cidade de Brotas de Macaúbas (BA), em 1926 e faleceu em junho de 2001, em São Paulo.
Seguem trechos do livro Território e Sociedade entrevista com Milton Santos, publicado pela Editora Fundação Perseu Abramo. Utilizou-se a segunda edição, novembro de 2000.
José Corrêa – Professor, grande parte de sua obra recente é dedicada à análise da globalização. Como o senhor caracteriza esse processo?
Milton Santos – A globalização conseguiu materializar a metafísica, mediante o papel desempenhado pela ciência e pela técnica na produção das coisas. Há uma materialização física e uma realização primitiva, embora sofisticada, da ideologia. Tudo é ideológico. Estamos dentro de um mar de ideologias. Tudo é produzido a partir de uma ideologia, mas as coisas não aparecem como tal. Somos cercados por coisas que são ideologia, mas que nos dizem ser a realidade. Isso nos constrange, porque forma um sistema muito forte; e qualquer discussão que indique ser aquilo ideológico é desqualificada.
José Corrêa – O senhor caracteriza a globalização como globalitarismo. Por que essa associação de globalização e totalitarismo?
Milton Santos – Estou querendo chamar a atenção para o fato de que a atual globalização exclui a democracia. A globalização é, ela própria, um sistema totalitário. Estamos em um mundo que nos reclama obediência. Uma frase que se ouve com grande freqüência, quando reclamos algo, é: “O senhor é o primeiro a reclamar”. Vocês nunca ouviram isso? Há um totalitarismo na vida cotidiana, que inclui o trabalho intelectual. Não é só no trabalho não intelectual, não é só na fábrica, que o totalitarismo está presente. Também no chamado setor de serviços. E a universidade é o exemplo formidável desse totalitarismo. Todos os dias somos solicitados a cumprir regulamentos, as normas... Mas é exatamente a norma que se opõe à essência do trabalho intelectual. Sem contar que rompe com a liberdade de o professor decidir o que é mais conveniente ao seu magistério. E tem-se isso a cada momento, em tudo. Há, portanto, um novo totalitarismo que, todavia, se apresenta como um convite a fazer as coisas bem-feitas, ordenadas. É um ritmo infernal que se impõe.
Olhem o que se passa na política. No caso do Brasil, por exemplo, o discurso do chefe da nação, por ser da nação, deveria ser pedagógico. E, no entanto, o nosso chefe da nação diz que todos os que não pensam como ele são canalhas, burros, estúpidos, vagabundos, não admite nenhuma discrepância com o que ele próprio pensa. É a eliminação do debate. O pensamento único é a prática da política e da convivência coletiva marcada por esse “faça assim, faça de tal forma, senão está tudo errado”. É a consideração simplória da técnica como absoluto, como norma – o que é próprio do nosso tempo - , levando à propensão de utilizar um mandamento técnico como se fosse um mandamento político, cultural, moral, religioso. É o fim da crítica e da autocrítica.
Odette Seabra – O que conduz a este ritmo? O que torna este movimento hegemônico? O que faz com que todo o mundo caminhe na mesma direção? Porque, aparentemente, quando se pergunta sobre globalização ao ministro da Fazenda, ele fala de mercado de capitais; quando perguntamos ao cientista, ele fala da ciência e da técnica; quando perguntamos a um empresário, ele reclama da concorrência e das entradas sutis, às vezes nem tanto, das multinacionais...
Milton Santos – Acho que o que conduz a esse ritmo hegemônico é a idéia de competitividade, que é diferente da competição capitalista, e que só se tornou possível nesta época, não era possível antes. Então ainda não se conhecia o mundo direito, não tínhamos o domínio da velocidade e os mercados eram relativamente regulados pela política nacional. A competitividade impõe o reino do fugaz, cria uma tensão permanente, que leva a esse atordoamento geral em que vivemos. Essa competitividade, possibilitada pelas atuais condições objetivas, é resultado da perversidade da globalização, e a única solução que parece viável é ir remando também. Quando um jovem opta pela competitividade como norma de vida é sociologicamente possível compreender, porque isso lhe aparece como a única defesa possível num mundo que não é nada generoso. É preciso mostrar-lhe que há outros caminhos, ainda que difíceis ou pouco conhecidos.
Mônica de Carvalho – Esse ritmo que nos é imposto pela competitividade acaba promovendo uma enorme ignorância que, por sua vez, acaba favorecendo a submissão àquelas normas que também nos são impostas. A velocidade com que as coisas se transformam, com que as normas se modificam, parece tornar as pessoas cada vez mais ignorantes, porque se sentem inseguras, desprovidas de referenciais...
Milton Santos – Quando o Ministério da Educação, no final de 1999, indicou as linhas mestras do novo ensino técnico, praticamente suprimiu o ensino de humanidades. Dessa forma, criaremos robôs, não propriamente cidadãos pensantes. E eu não vi reação. E por que nós não reagimos?"
Quero pensa sobre o porquê...........
Autonomia universitária é constitucional e inegociável!
Decretos Inconstitucionais
Segue abaixo o documento de Odete Medauar - professora titular de Direito Administrativo da Faculdade de Direito da USP.
.......................................................................................................
SOBRE OS DECRETOS ESTADUAIS RELATIVOS ÀS UNIVERSIDADES PAULISTAS
A Constituição Federal, no art. 207, diz o seguinte:
Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. (grifo nosso).
O dispositivo constitucional é muito claro, ao garantir a autonomia das universidades.
Portanto, qualquer ato ou medida que dificulte ou impeça o pleno exercício desta autonomia mostra-se inconstitucional.
Assim, ao meu ver, os decretos recentemente editados pelo governo do Estado de São Paulo, relativos às Universidades estaduais, revelam-se inconstitucionais.
As Universidades paulistas reputam-se das melhores do País e mesmo da América Latina. Seus principais gestores são professores titulados e concursados, aptos portanto, para administrá-las.
As autoridades estaduais deveriam despender seu tempo e esforço no ensino fundamental e médio do Estado, de notória má qualidade, ao invés de perturbarem as Universidades estaduais, de renomada qualidade.
Deixem as Universidades em paz! Cuidem do ensino fundamental e médio!
São Paulo, 21 de maio de 2007
segunda-feira, 21 de maio de 2007
Sobre a ocupação da reitoria da USP
Colo supra uma suscinta opinião sobre o caso, em nível micro e macro:
A POLÍCIA DE SERRA E AS IRONIAS DA HISTÓRIA
Recebemos esse texto que foi extraído de um outro blog, onde o professor Ricardo Musse coloca seu ponto de vista sobre a atitude do Governo atual e a autonomia universitária.
(blog fonte: http://www.blogentrelinhas.blogspot.com/ )
RICARDO MUSSE: A POLÍCIA DE SERRA E AS IRONIAS DA HISTÓRIA
Professor do departamento de sociologia da Faculdade de Filosofia,
Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, Ricardo Musse
fez para este blog uma análise sobre o embate em curso entre o governo
de São Paulo e os estudantes, funcionários e professores da USP.
Vale a pena ler o artigo na íntegra, a seguir:
"No momento em que se intensificam os indicadores positivos na
economia, quando, no jargão do mercado, se comprova "a solidez dos
fundamentos econômicos" do país, a oposição passa por uma crise sem
precedentes. Encurralada pela estratégia de Lula no córner de
"oposição conservadora e golpista" (no jargão popularizado por Paulo
Henrique Amorim), o PSDB patina e "bate cabeça".
A crise da USP é um bom observatório dessa situação. O governador
Serra iniciou seu mandato com uma série de decretos que colocam "sob
judice" a "autonomia" das universidades estaduais paulistas. Não custa
lembrar que, ao tomar posse na presidência, o torneiro-mecânico Lula
da Silva anunciou, no primeiro mandato, sua prioridade no combate à
fome e, no segundo, a ênfase no crescimento econômico.
O espanto foi geral. Como se sabe, mas não se costuma dizer, a
"autonomia" das três universidades nunca foi além de um "sim senhor!"
dos reitores ao governador de plantão, o que se comprova pelas idas e
vindas, ditos e desditos deles depois da ocupação da reitoria da USP.
Para se ter uma idéia de como essa autonomia é ilusória, basta
observar que eles nunca reclamaram publicamente do fato de que, embora
a contribuição para a previdência estadual seja descontada dos
salários de cada professor, é a universidade que paga as aposentadorias.
Uma vez que nunca houve autonomia política, a percepção geral foi de
que Serra mirava a autonomia administrativa, acadêmica e financeira.
Como os reitores, subservientes como sempre, não se posicionam
satisfatoriamente; como as associações dos docentes estão ofuscadas
por uma pauta "equivocada", que não vai além do mantra "mais verbas
para a educação", os alunos resolveram agir em defesa de sua
universidade.
Tudo não teria passado de mais um ato isolado do movimento estudantil
se a reitora, obediente a ordens superiores, não tivesse obtido um
mandato de reintegração de posse e ameaçado chamar a tropa de choque.
O apoio à ocupação espalhou-se como ondas entre estudantes,
professores, na sociedade e, pasme-se, até mesmo na imprensa.
O governador José Serra, o mais credenciado candidato à sucessão de
Lula, cai novamente na armadilha e aceita ser colocado como herdeiro
das forças políticas que prepararam e apoiaram o golpe militar de
1964. Tudo isso enquanto Lula procura vincular seu nome à linhagem de
Getúlio e JK.
Mas o mais engraçado dessa situação é o contraste da pauta de notícias
e manchetes dos jornais: no mesmo instante em que Lula usa sua polícia
para prender empreiteiros e políticos corruptos, a polícia de Serra
entra em prontidão para atacar os estudantes da USP - aqueles que
conseguiram, por mérito, vencer a disputa do vestibular mais
concorrido do país.
Visto de longe, fica a sensação de que José Serra já escolheu seu
candidato à presidência em 2010. Trata-se de um jovem político mineiro
chamado Aécio Neves. "
quarta-feira, 9 de maio de 2007
Prime
A película (traduzida como Terapia do Amor) é realmente excelente para discutir relações amorosas, relações familiares - inclusa as do cônjuge -, juventude, maturidade, dogmas, religião, cultura e tudo o mais que quiserem aqui acrescentar......... Garantied fun! O elenco se completa como poucas vezes pude testemunhar, além do quê o enredo de Ben Younger transpira inteligência. Esse pessoal do Upper West Side é 'soda'!!
quinta-feira, 3 de maio de 2007
Sobre a verdade
Gostaria de compartilhar isso que li por aí..........
"Não há nenhum pensamento importante que a burrice não saiba usar, ela é móvel para todos os lados e pode vestir todos os trajes da verdade. A verdade, porém, tem apenas um vestido de cada vez e só um caminho, e está sempre em desvantagem"
Robert Musil em O Homem sem Qualidades
terça-feira, 1 de maio de 2007
A luta nossa de cada dia
A figura ao lado foi uma tentativa de mostrar como a razão é importante pra afugentar nossos monstros, sejam coletivos ou individuais. Mas a 'razão triunfante' nunca bastou, humanísta. O mal jaz arraigado e tão profundamente enraizado em nossas 'doces almas' que nem o percebemos.
Alguns religiosos tentaram eliminar a causa do mal. Mas isso poderia custar a eliminação do próprio homem! Que fazer então? ("Porque o que faço não o aprovo; pois o que quero isso não faço, mas o que aborreço isso faço. E, se faço o que não quero, consinto com a lei, que é boa. De maneira que agora já não sou eu que faço isto, mas o pecado que habita em mim. Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum; e com efeito o querer está em mim, mas não consigo realizar o bem. Porque não faço o bem que quero, mas o mal que não quero esse faço. Ora, se eu faço o que não quero, já o não faço eu, mas o pecado que habita em mim. Acho então esta lei em mim, que, quando quero fazer o bem, o mal está comigo." Paulo aos Romanos)
Compartilho a dor da miséria humana e da justiça e juízo vindouros de D'us! (Aos Gálatas - "Não erreis: D'us não se deixa escarnecer; porque tudo o que o homem semear, isso também ceifará.").